Olá
Faz um tempo desde a última vez em que nos falamos, e um
maior ainda desde a última vez que nos vimos. Ainda lembro teu sorriso, teu
cheiro. Só de estar na mesma sala que você, eu me sentia embriagado em
felicidade, algo raro atualmente. Mas deixemos a saudade de lado. Como vai a
vida? Eu tenho passado por uns maus bocados. Problemas atrás de problemas.
Desilusão atrás de desilusão. Dor atrás de dor. Bem, acho que já entendeu.
Sabe do que lembrei dia desses? Aquela música que tu tinhas
adorado. Como é que era a letra? Era algo a ver com sorrisos e saudades. Não
consigo me lembrar agora, mas acho que tu sabes bem qual eu falo. Sempre que eu
a escuto, penso em ti. Vergonhosamente, admito isso. Falhei outra vez nessa
mísera missão. Parecia-me tão fácil e banal. Parece que esquecer alguém não é
tão fácil, ainda mais quando a imagem dessa pessoa te visita em sonhos todas as
noites.
Mas não sabes o pior, menina-moça. Lembras que eu almejava a
vida de músico? Ainda estou nessa batalha, parece que estou alcançando o primeiro
registro de meu trabalho. Das sete
músicas que temos, compus e ajudei a compor quatro. De vez em quando me impressiono com a minha
criatividade para isso. À noite, pego meu violão, deito em minha cama e toco.
Toco e crio, crio e toco. Daquelas cordas saem belas melodias, tão belas quanto
a tua voz. Tanta beleza não deveria pertencer a tantas pessoas. Ora, que
grosseria de minha parte, ser um compositor ciumento. Grande indiscrição de
minha parte.
Preciso te confessar algo. A vida é sádica, é cruel e é
fria. A vida, também, sabe o que faz, sabe as voltas que dá, sabe aonde nos
leva. Um poeta disse certa vez, que a vida é um rio e nós vamos descendo por
ele, cada um guiando a sua canoa. Sempre que penso nisso, imagino se você não
aceitaria dividir a minha canoa. Meu rio tem tido trajetos difíceis e rochosos.
Parece até que uma tempestade me acompanha e me leva mais abaixo ainda. Também
me pergunto como anda o seu rio. Será que tem sido tão tempestuoso quanto o meu?
Divides comigo essa dor da solidão, ó menina-moça? Ou navego sozinho neste
barco?
Agora, ao fim desta carta, me pergunto por que diabos
comecei a escrevê-la. Ah sim! Faz tanto tempo que não nos falamos que não nos vimos
e nem nos ouvimos, que percebi que precisava te pedir e te lembrar de algo. Peço-lhe
perdão se errei, se te feri ou se te fiz sofrer. Peço por uma chance de
redenção, por uma última chance de tentar fazer o certo, ou não, talvez o estrago
que causei não permita tais liberdades. Talvez, também, já tenhas te esquecido
disso (provavelmente já até me esqueceu, não?), mas quero te lembrar que te amo,
e não importa o que aconteça, quero que saibas que para sempre estarei aqui.
Mas lembra-te também, que essa velha voz do passado está meio caduca e fala coisas
estranhas e controvérsias, então alivie um pouco para este velho coração
machucado e doente, pois ele também falha e erra.
Aguardo resposta, ou um sorriso (ambos me agradariam)
D.
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